Pretendentes que só aceitavam cor branca eram 49%; agora, são 36%.
Pesquisa é de comissão responsável pelas adoções no estado de SP.
Daniela Lorenzon e os filhos Thalya e Nathan. (Foto: Arquivo pessoal)
A cor da pele já não tem a mesma importância de antes. Deficiências físicas também não têm tamanha relevância. A idade, aos poucos, passa a não ser fator fundamental. Pesquisa feita pela Comissão Estadual Judiciária de Adoção Internacional de São Paulo, obtida com exclusividade pelo G1, mostra que o preconceito dos pretendentes à adoção no estado cai a cada ano.
Os dados mostram que hoje 36% dos 2.094 pais à espera na fila só aceitam adotar uma criança da cor branca. Mas em 2005 eram 49%. Aqueles que colocam a cor como indiferente compõem 32% do total. Antes, eram 21%.
Os dados mostram que hoje 36% dos 2.094 pais à espera na fila só aceitam adotar uma criança da cor branca. Mas em 2005 eram 49%. Aqueles que colocam a cor como indiferente compõem 32% do total. Antes, eram 21%.
Os dados compilados pelo Tribunal de Justiça revelam ainda que os pretendentes têm se tornado mais conscientes em relação à realidade de abrigos no país. Isto porque em 2005 quase a metade dos pais (44%) só desejava recém-nascidos ou crianças até um ano de idade – fato que dificultava a possibilidade de uma aproximação. Atualmente, são 27% os que fazem questão de a criança ter até 12 meses de vida. E mais topam filhos acima de 2 anos.
Segundo o Cadastro Nacional de Adoção (que foi criado em 2008 e permite adoções interestaduais com mais facilidade), em todo o país há cerca de 4 mil crianças aptas à adoção: 85% delas têm de 5 a 18 anos.
Para a assistente social Clarinda Frias e para a psicóloga Sílvia Penha, autoras do estudo, a discrepância ainda “mostra muito sobre a sociedade”.
“Há um grande número de adolescentes (para adoção) enquanto a quase totalidade dos pretendentes à adoção são disponíveis (para crianças) no máximo até os 6 anos de idade. Isso aponta para o grande desafio ainda posto, de transpor e superar a cultura da institucionalização e priorizar as políticas públicas voltadas às famílias, para que cada vez menos adolescentes se vejam sem laços familiares, acolhidos em uma instituição”, dizem, na pesquisa.
Ainda de acordo com o estudo, em 2005 os que aceitavam irmãos eram 25%. Em 2008, já eram 32%.
Uma outra estatística que demonstra a queda no preconceito é a que trata das deficiências físicas e psicológicas. Foram mais de dez pontos percentuais de queda quando elas são consideradas tratáveis e leves.
“A evolução da disponibilidade dos pretendentes cadastrados, mesmo que pequena e gradual, no aumento da aceitação para a adoção de irmãos, respeitando-se os vínculos afetivos existentes, para crianças acima de dois anos, para adoção inter-racial e de crianças com um histórico que inclui situações de violência e problemas de saúde, faz parecer que a ampla discussão que vem sendo empreendida pelos profissionais das varas da Infância e Juventude, abrigos, grupos de apoio à adoção e demais agentes da rede de proteção aos direitos das crianças e adolescentes, começa a render frutos”, pontuam as autoras.
Um índice que permanece inalterado com o passar dos anos é a preferência por meninas, citada por 29% dos candidatos, contra 9% que dizem preferir só meninos.
“A evolução da disponibilidade dos pretendentes cadastrados, mesmo que pequena e gradual, no aumento da aceitação para a adoção de irmãos, respeitando-se os vínculos afetivos existentes, para crianças acima de dois anos, para adoção inter-racial e de crianças com um histórico que inclui situações de violência e problemas de saúde, faz parecer que a ampla discussão que vem sendo empreendida pelos profissionais das varas da Infância e Juventude, abrigos, grupos de apoio à adoção e demais agentes da rede de proteção aos direitos das crianças e adolescentes, começa a render frutos”, pontuam as autoras.
Um índice que permanece inalterado com o passar dos anos é a preferência por meninas, citada por 29% dos candidatos, contra 9% que dizem preferir só meninos.
'Não é supermercado'
Os publicitários Luís Roberto Duarte de Souza, de 42 anos, e Daniela Lorenzon, 33 anos, são o exemplo de tudo o que normalmente não acontece quando o assunto é adoção. Os dois adotaram crianças negras, irmãs e com mais de dois anos. E jamais pensaram em qualquer outro estereótipo. "Se ainda há tantas crianças em abrigos é porque as pessoas ainda idealizam o filho, porque na hora de adotar colocam um monte de condições como se estivessem com um carrinho de supermercado fazendo compras", diz Souza.
Por não fazerem a mínima questão de uma característica em especial, o processo dos dois foi recorde: 26 dias. "A gente podia ter filho biológico. Mas foi uma opção. A gente só quis saber a história deles. Não viu nem as fotos. Foi simplesmente amor", diz Daniela.
Apesar de tanto eles quanto Thalya, de 9 anos, e Nathan, de 8 anos, se sentirem totalmente à vontade como família, as pessoas quase nunca enxergam do mesmo modo, como conta Daniela. "Fisicamente somos muito diferentes. Então os amiguinhos deles ficam questionando na escola. Quando a gente vai a shoppings, restaurantes, ficam olhando feio, encarando. É cruel. Dá para saber quando o olhar é de curiosidade e quando é de reprovação. Isso já me incomodou muito. Mas agora a gente até se diverte com isso."
'Alma não tem cor'
Mãe e avó adotiva, Hália Pauliv de Souza, de 72 anos, é especialista em adoção. Além de livros publicados na área, trabalha há mais de dez anos como voluntária na Vara da Infância e da Juventude de Curitiba (PR) ajudando os pretendentes a escolher seus filhos. E ela diz que há, de fato, uma evolução. “As coisas estão caminhando. As pessoas estão percebendo que alma não tem cor. E isso não ocorre apenas em São Paulo, mas também aqui no Paraná e em todo o país.”
Ela tem duas filhas adotadas na década de 70. Uma delas também resolveu recentemente adotar crianças e fez logo questão de acabar com qualquer tabu: pegou duas meninas, irmãs, uma delas já com 7 anos. A outra tem 4.
“Quando se fala em ter um filho, toda mulher pensa em um bebê. Mas eu e meu marido já estávamos casados havia 11 anos e pensamos em crianças maiorzinhas. Queríamos dois ou duas, não importava o sexo, mas até 3 anos. Foi a sensibilidade da técnica que nos acompanhou que mudou isso da idade”, conta Fernanda Pauliv, de 35 anos.
Bruno e Joane, adotados ainda bebês. (Foto: Arquivo pessoal)
“Ela apenas colocou as fotos das duas na mesa. No momento, os olhos do meu marido encheram de lágrimas. E eu pensei: ‘São elas’. Quando a gente saiu de lá, decidiu já no carro”, diz. “Foi uma coisa sensata. Eu dou aula à noite. Ele tem uma empresa de eventos. Um bebê ia exigir muita dedicação. A criança maior é companheira, vai com a gente quando quer sair.”
Após quatro meses de convivência, ela diz: “Essa adoção tardia tem sido só de coisas boas. As meninas são fantásticas, estão 100% adaptadas”.
Após quatro meses de convivência, ela diz: “Essa adoção tardia tem sido só de coisas boas. As meninas são fantásticas, estão 100% adaptadas”.
A artista plástica Gildiney Raimunda da Silva, de 42 anos, também resolveu quebrar paradigmas: adotou uma menina com deficiência. Joane, hoje com 23 anos, foi sua primeira. Depois, ela teve um filho biológico: Alan, de 22 anos. Bruno, o último, também foi adotado. Tem 13 anos e é o xodó da casa. Craque no piano, é o orgulho dos pais.
Apesar da resistência de alguns parentes e amigos, ela jamais teve qualquer sinal de arrependimento. "Até cuido mais deles, parece que tenho uma obrigação", afirma. "Não dá para ficar ouvindo aquela história de que não se sabe de onde o bebê saiu. Caráter se constrói. E o amor se desenvolve."
Fonte e veiculo: G1
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